segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O Falso Mendigo

Minha mãe, manda comprar um quilo e papel almaço na venda
Quero fazer uma poesia.
Diz a Amélia para preparar um refresco bem gelado
E me trazer devagarinho.
Não corram, não falem, fechem todas as portas a chave.

Quero fazer uma poesia.
Se me telefonarem, só estou pra Maria
Se for o ministro, só recebo amanhã
Se for um trote, me chama depressa
Tenho um tédio enorme da vida [...]

Minha mãe estou com vontade de chorar
Estou com taquicardia, me dá um remédio
Não, antes me deixa morrer, quero morrer, a vida
Já não me diz mais nada [...]

Não aguento mais ser censor.
Ah, pensa uma coisa, minha mãe, para distrair teu filho
Teu falso, miserável, teu sórdido filho
Que estala em força, sacrifício, violência, devotamento
Que podia britar pedra alegremente
Ser negociante cantando
Fazer advocacia com o sorriso exato
Se com isso não perdesse o que por fatalidade de amor
Sabe ser o melhor, o mais doce e o mais eterno da tua puríssima carícia.

Vinicius de Moraes